13 de mai. de 2010


CARTAS DE PARIS

Verdes campos elísios



 Vou deixar bem claro desde o começo: eu não gosto da Champs-Elysées.
Às vezes, saindo da Place de la Concorde em destino à Étoile, num esforço muito grande de imaginação, consigo fantasiar as tropas napoleônicas vindo em direção contrária, cruzando o Arco do Triunfo a caminho do Palácio Real. Mas, quase sempre, quando eu olho para a avenida mais famosa de Paris, tudo que eu vejo é um monumento decadente ao esbanjamento.
Entre as lojas suntuosas - Louis Vuitton, Cartier, Porsche - e as lojas de departamento logo ao lado, a falta de consideração ao bom gosto parece ser o único elemento em comum daquele heterogêneo conjunto. Não é raro encontrar pelas galerias da avenida lojas decadentes vendendo produtos de quinta a preços de primeira. Menos raro ainda é encontrar hordas de turistas lá dentro, comprando, sem o menor senso crítico - nem do ridículo.
Ainda que eu saiba que ela existe, não consigo ver a beleza arquitetônica da Champs-Elysées. São tantos painéis publicitários, tantas fachadas alteradas para dar destaque a tantas marcas diferentes, tantos puxadinhos de restaurantes no meio das largas calçadas, é tanto trânsito no meio da rua, tantos caminhões de entrega, ônibus turísticos, carros de passeio com gente dentro tentando filmar, fotografar ou ver qualquer coisa, que é impossível enxergá-la de verdade.
Poderia me estender falando da falta de estilo e de espírito parisiense nos cafés da região. Ou no absurdo que é pagar por um chopp o dobro do preço que se pagaria na região da Bastilha ou em République.
Mas, acreditem, não é para falar mal da Champs-Elysées que eu decidi escrever essa coluna. É para falar bem. Ou pelo menos com esperança.
A partir do noite do próximo dia 22, uma exposição ecológica efêmera será montada em plena avenida, no coração de Paris. Mais de 150 espécies de vegetais vindas de todas as regiões da França serão plantadas numa extensão de três hectares, transformando todo aquele concreto e asfalto em um grande jardim.
Os franceses adoram fazer isso. Mais do que promover palestras ou veicular campanhas publicitárias, o poder público investe muito em instalações que levam para o centro da cidade um olhar novo sobre alguma questão - no caso, a crise no setor rural, a distância com que o francês (especialmente o parisiense) passou a tratar tudo o que diz respeito ao campo.
A ideia é trazer para o centro da cidade o processo de plantio e cultivo dos mais diversos tipos de vegetais. Há vinte anos, uma iniciativa parecida marcou época na cidade, ficando conhecida como "a grande colheita".
A invasão verde da Champs-Elysées dura apenas dois dias - no domingo, o imenso jardim começa a ser desmontado. Uma oportunidade rara - e rápida - para ver com outros olhos a avenida mais procurada pelos turistas.

Carolina Nogueira é jornalista e mora há dois anos em Paris, de onde mantém o blog Le Croissant (www.le-croissant.blogspot.com)

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