Ser mãe em Portugal
RENATA RAMALHO

Para além dos números, porém, o que será que corre assim tão bem por cá? Ao final deste primeiro ano como mãe, parece-me que tudo começa na maternidade. Embora tenha tido uma experiência muito má com o hospital em que nasceu a Alice, como já contei por aqui, há duas coisas de que gostei imenso, que provavelmente não teria no Brasil. A primeira delas é o próprio parto -- por cá há um grande incentivo ao parto normal, sendo a cesariana vista como uma intervenção que só se deve fazer se necessário. A segunda, em ordem cronológica, o facto de o bebé estar sempre ao pé da mãe, da sala de parto à saída do hospital. Por cá, a menos que haja necessidade de cuidados médicos especiais, o bebé sai da sala de parto nos braços da mãe e fica todo o tempo no quarto desta, num berço ao pé da sua cama.
As diferenças continuam com o tempo. Em Portugal, a licença maternidade é de 4 meses pagos a 100% do salário -- ou seja, à excepção dos funcionários públicos e outros poucos privilegiados cujas empresas aderiram à licença de seis meses, igual à do Brasil. No entanto, aqui é possível optar por uma licença de cinco meses paga a 80% do salário, de seis -- sendo ao menos um gozado pelo pai, que tem também uma licença inicial de 10 dias úteis -- pagos a 83% ou ainda de um ano (também partilhado com o pai), em que os últimos meses são remunerados a 25%. Com um detalhe: a opção aqui é do funcionário, e não da empresa, o que faz toda a diferença. E se a mãe regressar ao trabalho antes de um ano, conta com uma redução no horário de trabalho de 2 horas por dia -- que pode ser prolongada para além do primeiro ano, caso comprove que continua a amamentar.
Mas as maiores diferenças são aquelas que se alongam por toda a infância das crianças, e que têm mais a ver com cultura do que com legislação: a expectativa de que sejam os pais a cuidar do filho doente ao invés de delegar o cuidado a uma empregada e a tranquilidade de criar uma criança num local seguro, onde a criminalidade é baixíssima.
É claro que também há problemas, principalmente quando comparado com países da Europa do Norte. Em Portugal, o apoio governamental à natalidade é praticamente inexistente: um estudo da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico (OCDE) apontou o país como aquele com menor apoio fiscal às famílias -- segundo o jornal I, na Europa fica à frente apenas de Espanha e Polónia. Há uma falta de vagas tal nas creches públicas que é praticamente impossível conseguir lugar a menos que se tenha de facto rendimentos muito, muito baixos ou que se seja mãe solteira (ainda que apenas por não estar casada no papel com alguém que é seu "marido" de facto). Quanto às escolas, nem sempre a pública é uma uma opção, e há cada vez mais gente a optar pelos colégios privados.
Ainda assim, e apesar da saudade da família, hoje digo que a Alice é mais um motivo para ficar por cá do que para regressar ao Brasil. Esperemos que a cada dia das mães a vida seja melhor -- por cá, por aí e em todos os lugares do mundo.
Um grande beijo para todas as mães -- e um especial para a minha.
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