9 de mai. de 2010


Ser mãe em Portugal

RENATA RAMALHO


Ser mãe é bom. Ser mãe na Noruega é melhor. Visto de forma grosseira, é o que se pode concluir do estudo "Estado das Mães no Mundo 2010", que a organização "Save the Children" divulgou esta semana em homenagem ao dia da(s) mãe(s), comemorado em Maio um pouco por todo o mundo. Mas ser mãe em Portugal também não é nada mal: o país aparece em 19º lugar no grupo dos "desenvolvidos", uma espécie de "primeira divisão" do estudo. Fica atrás dos países da Europa do Norte -- Dinamarca, Finlândia -- e da França, Alemanha e Itália, mas a frente da Áustria, do Canadá e dos Estados Unidos. Não é possível fazer uma comparação directa com os dados do Brasil, uma vez que este "concorre" na "segunda divisão" ("less developed countries", não confundir com "least developed countries", a terceira divisão que tem na rabeira o Afeganistão) -- um grupo considerado por definição inferior ao primeiro. Mas tendo em conta os dados apresentados em ambos os grupos (alguns, como licença maternidade, são tidos em conta para Portugal, mas não para o Brasil), os dados portugueses são apenas levemente melhores do que os brasileiros, com duas excepções fundamentais: os índices de mortalidade materna e infantil, que no Brasil são ridiculamente altos.
Para além dos números, porém, o que será que corre assim tão bem por cá? Ao final deste primeiro ano como mãe, parece-me que tudo começa na maternidade. Embora tenha tido uma experiência muito má com o hospital em que nasceu a Alice, como já contei por aqui, há duas coisas de que gostei imenso, que provavelmente não teria no Brasil. A primeira delas é o próprio parto -- por cá há um grande incentivo ao parto normal, sendo a cesariana vista como uma intervenção que só se deve fazer se necessário. A segunda, em ordem cronológica, o facto de o bebé estar sempre ao pé da mãe, da sala de parto à saída do hospital. Por cá, a menos que haja necessidade de cuidados médicos especiais, o bebé sai da sala de parto nos braços da mãe e fica todo o tempo no quarto desta, num berço ao pé da sua cama.

As diferenças continuam com o tempo. Em Portugal, a licença maternidade é de 4 meses pagos a 100% do salário -- ou seja, à excepção dos funcionários públicos e outros poucos privilegiados cujas empresas aderiram à licença de seis meses, igual à do Brasil. No entanto, aqui é possível optar por uma licença de cinco meses paga a 80% do salário, de seis -- sendo ao menos um gozado pelo pai, que tem também uma licença inicial de 10 dias úteis -- pagos a 83% ou ainda de um ano (também partilhado com o pai), em que os últimos meses são remunerados a 25%. Com um detalhe: a opção aqui é do funcionário, e não da empresa, o que faz toda a diferença. E se a mãe regressar ao trabalho antes de um ano, conta com uma redução no horário de trabalho de 2 horas por dia -- que pode ser prolongada para além do primeiro ano, caso comprove que continua a amamentar.
Mas as maiores diferenças são aquelas que se alongam por toda a infância das crianças, e que têm mais a ver com cultura do que com legislação: a expectativa de que sejam os pais a cuidar do filho doente ao invés de delegar o cuidado a uma empregada e a tranquilidade de criar uma criança num local seguro, onde a criminalidade é baixíssima.
É claro que também há problemas, principalmente quando comparado com países da Europa do Norte. Em Portugal, o apoio governamental à natalidade é praticamente inexistente: um estudo da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico (OCDE) apontou o país como aquele com menor apoio fiscal às famílias -- segundo o jornal I, na Europa fica à frente apenas de Espanha e Polónia. Há uma falta de vagas tal nas creches públicas que é praticamente impossível conseguir lugar a menos que se tenha de facto rendimentos muito, muito baixos ou que se seja mãe solteira (ainda que apenas por não estar casada no papel com alguém que é seu "marido" de facto). Quanto às escolas, nem sempre a pública é uma uma opção, e há cada vez mais gente a optar pelos colégios privados.
Ainda assim, e apesar da saudade da família, hoje digo que a Alice é mais um motivo para ficar por cá do que para regressar ao Brasil. Esperemos que a cada dia das mães a vida seja melhor -- por cá, por aí e em todos os lugares do mundo.
Um grande beijo para todas as mães -- e um especial para a minha.

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