25 de abr. de 2010


"Que a impunidade não vença a Justiça"

"Morosidade é denegação da própria Justiça"





Em discurso de agradecimento, ao receber a "Medalha Joaquim Nabuco dos Direitos Humanos", concedida pelo Conselho Nacional de Justiça, o jurista Hélio Bicudo sugeriu que se faça "um debate sobre a própria estrutura do Poder Judiciário, com vistas prioritárias à primeira instância".

Eis a íntegra do pronuncimento de Bicudo:

 
"Antes de mais, quero dizer o quanto nos sentimos honrados ao receber a condecoração Joaquim Nabuco de Direitos Humanos, que ora nos é concedida pelo Egrégio Conselho Nacional de Justiça.

Trata-se, sem dúvida, de uma inspiração. Joaquim Nabuco tem seu nome gravado na linha de frente de uma das lutas mais emblemáticas pelos direitos humanos que já se travaram no Brasil, em parte vitoriosa com a assinatura da Lei Áurea pela princesa Izabel, em 1888. Digo em parte porque a luta pelos direitos humanos dos negros não vem alcançando a sua esperada redenção anunciada pela abolição. Ainda hoje - mais de cem anos passados - a população negra e seus descendentes encontram grandes obstáculos para ver respeitados os seus direitos enquanto pessoas humanas. Relegados, muitas vezes, ao só embate pela subsistência, negam-se a eles os valores que emolduram a sociedade dos homens.

A lei que aboliu a escravatura não conseguiu propiciar a real libertação dos escravos, desde que eles e seus descendentes continuaram e continuaram, ainda em grande parte, presos às iniqüidades do passado e somente com muito empenho e superando preconceitos ainda arraigados na sociedade brasileira, conseguem ascender a uma igualdade ainda relativa aos seus irmãos brancos.

E assim, lamentavelmente tem sido.

É por tudo isso que entendo do maior relevo social e político a instituição da Medalha Joaquim Nabuco dos Direitos Humanos, a revelar a nítida vocação desse importante órgão da Justiça brasileira pelo respeito aos Direitos Humanos em nosso País.

A trajetória desse douto Conselho vem, em particular nestes últimos anos, mostrando que sem Justiça não há que falar em Direitos Humanos. Daí a sua presença onde a morosidade da Justiça vem se constituindo numa verdadeira fonte de denegação da própria Justiça.

As intervenções aqui e acolá para movimentar uma máquina por vezes emperrada; a sua atenção para com as mazelas de um sistema penitenciário arcaico, o qual se constitui em insólito espaço para uma punição que soma à pena imposta pelo juiz, significativa crueldade; uma decidida atuação para a libertação de detentos com pela já cumprida ou corrigindo os excessos no seu cumprimento; tudo isso e muito mais que tem sido feito qualifica a atuação do Conselho Nacional de Justiça como fator fundamental na distribuição equânime da justiça, corrigindo distorções que se vem somando à indiferença dos que se acomodam.

Entendo que o caminho percorrido, sob a esclarecida presidência do ilustre ministro Gilmar Mendes tem o duplo caráter, de contemplar a Justiça como um direito humano por excelência, e de se constituir em verdadeira e permanente denúncia contra as atuais práticas da justiça brasileira no enfrentamento de uma criminalidade em ascensão, onde a impunidade, além de seletiva, vem se constituindo em lamentável regra.

Em consequência, ao solidarizar-nos com os atos que vêm sendo praticados pelo douto Colégio, no cometimento de suas atividades, a despeito de resistências de todos conhecidas, ouso, sugerir que se institua um espaço para que se faça um debate sobre a própria estrutura do Poder Judiciário, com vistas prioritárias à primeira instância, buscando-se uma nova dinâmica, onde o juiz não perca sua qualificação humana, para que a impunidade não possa vencer a Justiça".

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