20 de fev. de 2010

editorial do ESTADÃO


A apologia da maturidade



Agora, o presidente tratou de acalmar as preocupações surgidas com a divulgação, por este jornal, da versão original do programa do partido para um governo Dilma, que endeusava o estatismo e calava sobre o destino das políticas macroeconômicas mantidas por Lula (ajuste fiscal, metas de inflação e câmbio flutuante). Ele e a sua escolhida já haviam aparado os excessos e inserido o que fora omitido no texto preparado para o 4º congresso nacional petista que hoje aclamará o nome da candidata. Na entrevista, discorrendo pela primeira vez em público sobre o assunto, o carbonário de outrora revelou-se um bombeiro exemplar. "Num congresso do PT aparecem 20 teses", comentou. "É que nem uma feira de produtos ideológicos. As pessoas compram o que querem e vendem o que querem." E foi ao que lhe interessava: "O PT que chegou ao governo é o PT maduro."

Lula, no seu melhor, louvou Deus por não ter vencido a primeira eleição presidencial de que participou, em 1989. Se ganhasse, "com a cabeça do jeito que eu pensava", ou teria feito uma revolução ou cairia no dia seguinte. Treze anos depois, descobriu como remover o bloqueio que o impedia de chegar lá. O achado, recordou, foi a escolha de José Alencar para vice e a Carta ao Povo Brasileiro. "Essa mistura de um sindicalista com um grande empresário e um documento que fosse factível e compreensível pela esquerda e pela direita, pelos ricos e pelos pobres, é que garantiu a minha chegada à Presidência." E será esse espírito agregador, assegurou, que elegerá Dilma e lhe dará condições de governar. "O partido não vai jogar fora a experiência de ter um governo aprovado por 72% depois de sete anos no poder", insistiu. "Isso é riqueza que nem o mais nervoso trotskista seria capaz de perder."

Talvez tenha razão. Mas o guardião dessa riqueza é o próprio Lula. Dado que ele promete não voltar ao Planalto - é "ponto pacífico", afirmou, que Dilma, se eleita, terá o direito de disputar novo mandato em 2014 - fica a critério de cada qual julgar se ela desejará, ou poderá, ser a mantenedora do patrimônio de conciliação acumulado por Lula, diante de um partido cuja "sabedoria" quem sabe não seja tão grande como ele quer fazer crer - e sem a sua atuação moderadora. Candidata, Lula estará "espiritualmente" ao seu lado. Se eleita, ele ficará "torcendo na arquibancada". 

Lula se estendeu sobre o que entende ser o papel do Estado na economia. Começou brincando: "O único Estado forte que eu quero é o Estadão." A sério, negou que passe por sua cabeça a defesa de um governo "gerenciador". Mesmo quando fala em criar uma megaempresa de energia, por exemplo, assinala que "não queremos ser donos de nada". Não está claro se Dilma pensa do mesmo modo.

Lula ofereceu aos seus entrevistadores as porções usuais da ética de resultados que o orienta. Abraçou-se a Collor porque "o exercício da democracia exige que você faça política em função da realidade que vive". Contou que, diante da bancada petista no Senado que queria "cassar" Sarney, objetou: "Muito bem, vocês cassam o Sarney e quem vem para o lugar?" Perguntado sobre o mensalão, disse que "tem de investigar". Mas não contem com ele para tal enquanto for presidente, ressalvou. Vai ver é por isso que, segundo a Folha de S.Paulo, Lula ainda não respondeu às 33 perguntas do Ministério Público sobre o que sabia do escândalo. O questionário chegou ao Planalto há mais de três meses.

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