22 de jun. de 2009

Coisa rara: a Folha está certa

O editorial do jornalão paulista sobre a questão do diploma está corretíssimo e merece ser reproduzido aqui. É tão simples esta questão que causa realmente um certo estranhamento a reação destemperada dos estudantes de jornalismo e de certos coleguinhas sindicalizados. Não há razão para pânico, pessoal, jornalistas com e sem diploma já convivem nas redações há muito tempo. Na hora de contratar, os jornais farão como as agências de publicidade fazem: olham o currículo, realizam provas e entrevistas, e escolhem os melhores, independente do curso que fizeram. Que diferença, afinal, existe entre as profissões de publicitário e jornalista? Nenhum estudante enfurecido até agora conseguiu explicar... Abaixo, o editorial da Folha. E vamos em frente.

Um jornalismo melhor

Extinguiu-Se finalmente, numa decisão histórica tomada pelo Supremo Tribunal Federal, a exigência de diploma de curso superior em jornalismo para o exercício da profissão.
Originária de um decreto-lei promulgado pelo regime militar em 1969, a obrigatoriedade do diploma foi considerada inconstitucional pela ampla maioria dos ministros da mais alta corte, com apenas um voto a favor de sua manutenção.

O debate em torno do assunto prolongou-se durante mais de 20 anos, dividindo a categoria dos jornalistas e opondo a estrutura sindical à maioria dos veículos de comunicação. Os principais beneficiários da obrigatoriedade do diploma, entretanto, não eram diretamente as organizações sindicais, mas as faculdades de jornalismo, que contavam com uma espécie de "reserva de mercado" para seus egressos.

Faculdades de jornalismo sempre tiveram uma contribuição a dar para a prática da profissão. Trata-se, mais que nunca, de confiar na melhoria de seus padrões de ensino e no aporte seja de técnicas específicas, seja de uma formação humanística geral, que podem trazer ao interessado na carreira de jornalista.

O que nunca se justificou -e vai se revelando cada vez mais anacrônico diante da proliferação do jornalismo pela internet- é restringir apenas aos detentores de diploma específico uma atividade que só se beneficia quando profissionais de outras áreas -médicos, filósofos, historiadores, biólogos- encontram lugar nas redações.

Foi bastante claro o voto do ministro Gilmar Mendes, relator do processo no STF, ao distinguir as profissões que de fato dependem de conhecimento técnico específico daquelas que dispensam regulamentação formal. Uma sociedade que não estipulasse requisitos para a carreira de médico estaria, obviamente, ameaçada pelo exercício inepto da profissão.

É igualmente certo que o jornalismo, como qualquer outra atividade, não está imune a erros, no caso, de apuração e redação. Não é, todavia, pelo fato de possuir diploma superior de jornalismo que um profissional estaria mais ou menos propenso a cometê-los.
O aperfeiçoamento do jornalismo praticado no Brasil não depende de tutelas legais e autoritárias, mas, ao contrário, da contribuição dos talentos e das vocações de todos os que, a despeito de sua formação escolar específica, sejam capazes de trazer à sociedade informações, análises e opiniões mais aprofundadas, mais claras e mais abrangentes.

A decisão do Supremo Tribunal Federal vem, finalmente, contribuir para que esse árduo compromisso -que é o da Folha - não encontre em dispositivos cartoriais, desconhecidos na ampla maioria dos países democráticos, um impedimento anacrônico, incompatível com o direito à informação, com a liberdade profissional e com a realidade, cada vez mais complexa, do jornalismo contemporâneo.

Um comentário:

  1. Começei a sobreviver da profissão em 1967, nos jornais da Folha, onde passei 19 anos, antes de sua regulamentação, dois anos depois, pela ditadura, que pretendia - e conseguiu - afastar das redações as cabeças pensantes. Sou, portando,apesar de três cursos superiores, um jornalista sem diploma.
    Libertar da exigência do diploma deve ser comemorada como uma manifestão histórica do STF. Uma manifestação que permitirá devolver às redações o acesso indispensável à livre circulação de idéias, elemento fundamental da democracia.
    Os que estão esperneando com o fim da exigência do diploma são, na sua grande maioria, os burocratas despejados no mercado pelas faculdades.
    Como um repórter aposentando desde janeiro, gostaria de revelar uma experiência que vivi em A Tribuna (Santos), onde trabalhei 15 anos como editor de política e colunista, também político. Quando montei a editoria de política, pretendi recrutar nas faculdades um repórter para completar uma equipe de cinco. Entre os vinte e oito candidatos selecionadoos, nenhum possuia um mínimo conhecimento da história da jovem república brasileira. E todos eram candidatos a uma vaga na editoria da política. A maioria desconhecia quem foi Getúlio Vargas, a ditadura do Estado Novo e não possuiam a menor idéia de fatos importantes. Informações que são obtidas no livro a História de República Brasileira, de Lincoln Martins, de apenas 273 páginas. Não pretendia contratar nenhum especialista na política brasileira; queria apenas dar uma oportunidade a alguém que tivesse acabado de sair de um curso que "forma jornalistas". Desisti e fui obrigado a recrutar um companheiro de redação para compor a equipe. Ao longo de muitos anos de profissão testemunhei fatos semelhantes protagonizados por jornalistas diplomados. Ao extinguir a necessidade do diploma o STF presta um notável serviço serviço ao país e, certamente, à produção de profissionais que, uma vez candidatos a uma editoria de política, tenham uma vaga noção do que foram os anos de chumbo da ditadura, que regulamentou profissão. Estes certamente estão convencidos que a decisão do STF deve ser comemorada como a retomada da total liberdade de expressão, sem a reserva de mercado.
    Fernando Allende.

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