28 de mar. de 2010


Inferno em confissão ou dormitórios. Novas revelações implicam Papa, quando ainda era cardeal

Em incursões noturnas, padre pedófilo abusava de meninos surdos
http://blog.cancaonova.com/brasilia/files/2009/03/confissao272.jpghttps://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj4-F6q9LW-5KRzTa8YSSj3hHFQEm3f_QCZKt67idrsFDdSvlzHyot2-YRnTNZ8Yh_-AKAqOar1LzV1C58hX8wPG9p2Xevrj8pjqx1fYj88VW3o81KPGjJBRSVBUvWrxfSGVAQIsIgl_JY/s400/padre-pedofilo-564645.jpg

Yolanda Monge – El País – O Globo

WASHINTON. Às vezes, acontecia durante a confissão. Em outras, no meio da noite, nos dormitórios. O padre Murphy chegava, o masturbava e ia embora. Aos 13 anos, Arthur Budzinski se escondia debaixo da cama chorando, com medo do próximo ataque e incapaz de pedir ajuda. O inferno dos abusos sexuais que viveu nas mãos do sacerdote em quem sua família confiou sua educação não podia ser relatado aos pais, que não conheciam a linguagem dos sinais. Budzinski era surdo e incapaz de falar. Anos depois do abusos que marcaram sua vida para sempre, aos 60 anos Budzinskipode relatar hoje as violações às quais fora submetido. E ele o faz com as mãos, através da linguagem que lhe ensinou seu algoz.
A escola para deficientes auditivos Saint John, em Milwaukee, no estado americano de Wisconsin, fechou as portas em 1983 por razões econômicas, mas na quinta-feira, o jornal “The New York Times” levantou uma poeira escondida em quase um quarto de século.
—Estava na quadra jogando basquete e os meninos vinham dizer: “o padre Murphy quer te ver”. Eu tentava fugir, mas eventualmente o padre me arrastava até seu escritório e abusava de mim. Mais uma vez. Nunca disse a ninguém.
Eu pensei que estava sozinho — contou James Smith, que somente depois de adulto pôde enfrentar os demônios do passado.
Os abusos eram corriqueiros. E não só autoridades da Santa Sé deixaram de fazer justiça.
No caso da pedofilia na diocese de Milwaukee, que agora atinge o Vaticano, tribunais comuns também ignoraram queixas das vítimas por muito tempo. Três arcebispos sucessivos de Wisconsin sabiam que o padre Murphy abusava das crianças de St. John, mas nunca informaram às autoridades civis, segundo o “Times” —que obteve os documentos dos advogados Jeff Anderson e Mike Finnegan, contratados por cinco das vítimas do padre, para processar a arquidiocese. Nem a polícia, nem o Ministério Público. Ninguém fez nada. As rondas noturnas do sacerdote às vezes incluíam o abuso de mais de uma criança.
— Quase nunca ele falava alguma coisa — contou Steve Geier, que começou a ser molestado aos 7 anos de idade.
Confusa, vítima, então com 7 anos, questionava: “Deus, será que isso é certo?”
Às vezes, quando outros pequenos viam como o padre abusava de seus companheiros, cobriam as cabeças com cobertores, se abraçavam e choravam juntos.
— Murphy era muito forte e poderoso. Você não podia escapar. Era como estar em uma prisão.
Eu me sentia confuso e enquanto padre Murphy me acariciava, perguntava “Deus, isso é certo?” — recordou Geier numa entrevista ao diário Milwaukee Journal Sentinel, em 2006.
O padre Murphy nunca foi punido. Dizendose arrependido de seus pecados, admitiu a uma assistente social ter molestado 30 crianças.
Murphy foi discretamente transferido em 1974 para outra diocese, no norte do estado, e lá passou seus últimos 24 anos. Rodeado por crianças nas paróquias, escolas e em um centro de detenção juvenil onde fazia prédicas.
Murphy morreu em 1998, aos 72 anos, e foi enterrado usando o hábito. Sua família desobedeceu às instruções da arquidiocese para que o funeral fosse discreto e o caixão, mantido fechado. Para muitos, padre Murphy era quase um santo. Um homem capacitado para entender os surdos e comunicarse com eles através da linguagem de sinais, além de demonstrar grande habilidade para arrecadar fundos para a causa. Apenas as vítimas sabiam o que se passava quando o sacerdote de rosto redondo chamava-as em seu escritório, ou tocava-as dentro de seu carro, ou na casa de sua mãe. Uma foto de 1960 mostra 11 crianças vestindo uniformes de basquete. No lado esquerdo, está padre Murphy, vestido de batina, segurando a bola com os meninos. Pelo menos cinco destes jovens admitiram ter sido molestados por seu confessor.

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